O processamento mid-side pode ser extremamente útil na manipulação do estéreo e profundidade durante a mixagem e, sobretudo, na masterização. A concepção da técnica mid-side surgiu nos anos 30 e hoje em dia tem se tornado cada vez mais popular entre os plugins de mixagem e masterização.

Entretanto, o tema gera muitas dúvidas e insegurança entre os produtores de música eletrônica e engenheiros de mixagem em geral. Por isso, é essencial dominar alguns conceitos básicos de áudio para compreender o processamento mid-side de forma correta e tirar o melhor proveito dessas técnicas em suas mixagens.

Neste artigo, você vai aprender os conceitos fundamentais sobre estéreo e processamentos mid-side, além de exemplos de utilização e diferentes técnicas.

A Ilusão do Estéreo

Antes de entendermos o conceito de MID-SIDE, precisamos entender o conceito de ESTÉREO. Se você produz no Ableton, Logic, FL ou qualquer outra DAW, você provavelmente está acostumado a trabalhar com canais estéreo.

Isso quer dizer que, em cada canal, existem 2 lados mono, o L (left-esquerdo) e o R (right-direito). O que você ouve é a soma dos 2 canais MONO formando um canal ESTÉREO.

Se você tiver uma informação exatamente IGUAL nos lados L e R, o sinal final será mono. Por outro lado, se houver qualquer diferença entre os 2 lados, ela será percebida como estéreo.

Confuso? Calma… continue lendo!

O que você precisa entender é que o estéreo é a DIFERENÇA entre a informação sonora dos canais L e R.

Portanto, qualquer coisa que diferencie o canal esquerdo do canal direito (e vice-versa) é o que cria a ILUSÃO de que os sons vem de lugares diferentes dentro do campo estéreo.

É exatamente por isso que o posicionamento correto dos monitores é tão importante. Quando temos um triângulo equilátero entre os 2 monitores e a sua cabeça, a percepção do estéreo é mais adequada. Em contrapartida, se os 2 canais (L e R) fossem exatamente iguais, você ouviria um som mono.

O que é MID-SIDE?

O conceito de MID-SIDE é muito, muito parecido com o conceito de MONO-STEREO. Tanto é que alguns plugins que possuem esse recurso utilizam outras nomenclaturas, como por exemplo, MONO-STEREO ou SUM-DIF (soma/diferença) etc…

Ou seja, agora que você já entendeu o que é mono e estéreo, já deve estar imaginado que o mono é a mesma coisa que MID e o estéreo é a mesma coisa que o SIDE.

Bem, é praticamente isso!

O MID consiste nas partes idênticas entre L e R e SIDE consiste nas diferenças entre L e R. Acho que você já entendeu isso, né?

Hoje em dia, muitos plugins permitem realizar processamentos (compressão, equalização, saturação etc), de maneira separada, no MID e no SIDE.

É claro que daria para realizar processamentos no MID e no SIDE, de forma, separada, sem esses plugins especiais, mas dá um trabalhinho (e não vamos perder tempo com isso aqui agora).

Para nos aprofundarmos no entendimento do MID-SIDE, precisamos compreender o que é polaridade, fase e correlação. Estes são conceitos essenciais a compreensão do MID-SIDE.

Polaridade

Polaridade é a orientação positiva ou negativa de uma forma de onda em relação a outra.

Se você tiver duas formas de onda idênticas e depois inverter a polaridade de uma delas, a versão de polaridade negativa é uma imagem espelhada da versão positiva.

O resultado é que as duas se cancelarão por completo.

Na imagem abaixo temos 2 ondas (azul e roxo) com a mesma polaridade e o resultado da somatória (amarelo) é uma onda com maior amplitude.

Créditos da imagem: thedustbowlaudio.com/

Já neste outro exemplo, uma onda com a polaridade exatamente oposta em relação à primeira resulta em um cancelamento total.

Créditos da imagem: thedustbowlaudio.com/

Fase

A fase, muitas vezes confundida com a polaridade, é a posição de uma onda no tempo (em relação a outra).

Por exemplo, se você aplicar uma mudança de fase a uma forma de onda, você a moverá para frente ou para trás no tempo. Você não ouvirá nenhuma diferença ao ouvir a forma de onda por si só, mas ouvirá se tiver um ponto de referência como outra onda.

Se você aplicar uma mudança de fase a uma faixa de uma mixagem e deixar todo o resto como está, estará deslocando a faixa para frente ou para trás no tempo (em relação ao restante da mixagem), o que pode ser bastante perceptível em determinadas situações – por bem ou por mal.

O ponto principal é que a FASE está relacionada ao TEMPO, o que é muito diferente da polaridade.

Créditos da imagem: thedustbowlaudio.com/

Correlação

A correlação, por sua vez, diz respeito ao alinhamento de polaridade entre dois canais. Quando a polaridade entre 2 canais é idêntica, haverá uma soma, ou seja, aumento de amplitude (volume).

Quando a polaridade é exatamente oposta, ocorre o cancelamento total, ou seja, zero volume.

Quando a polaridade é parcialmente diferente, ocorre um cancelamento parcial, que muitas vezes é percebido como um efeito de Comb-Filtering ou simplesmente como uma certa degradação do sinal.

Portanto, é extremamente importante ter um plugin de medição da correlação (correlation meter) quando for mixar as suas tracks. Estes plugins irão mensurar se a correlação está positiva ou negativa.

Se o resultado for próximo de 1, significa que há mais pontos correlatos do que diferentes, ou seja, é mono-compatível. Se a correlação for exatamente 1, significa que o sinal é mono. Já se estiver entre 0 e -1 significa que há mais pontos não-correlatos do que correlatos, significando que existem problemas de mono-compatibilidade. Ou seja, quando somados os canais L e R, haverá muitos cancelamentos.

O Processamento MID-SIDE

O processamento mid-side consiste em separar o MID (soma dos canais L e R) e o SIDE (diferença entre os canais L e R) e processá-los de maneira individual.

Desta forma, você pode aplicar equalização, compressão, saturação, limiting etc em ambos os canais, de forma separada.

Esta técnica é mais utilizada na masterização, mas também pode ser utilizada durante a mixagem. Entretanto, é importante que, primeiro, você faça todo o balanceamento da sua mix antes de qualquer processamento MID-SIDE.

DICA NINJA: Experimente começar a sua mix em mono, colocando um Utility no canal Master. Desta forma, você terá um balanceamento mais adequado, para depois poder trabalhar o estéreo.

O processamento MID-SIDE é utilizado, na maioria das vezes, para se conquistar maior abertura estéreo e profundidade na sua mix e master.

Por exemplo, imagine que você tem um vocal no centro e backing vocals ou reverb nos sides. Com este processamento, você consegue balancear de forma mais precisa a relação entre os 2 (mid e side).

Quando você utiliza um equalizador, por exemplo, no modo Estéreo, qualquer manipulação irá afetar ambos, o mono e o estéreo. Já num equalizador no modo mid-side, por exemplo, você consegue equalizar separadamente o mid e o side. Desta forma, você pode tornar um elemento mais centralizado, “na cara” ou torna-lo mais espacial e aberto.

DICA NINJA: É importante lembrar que o processamento mid-side é UMA das técnicas de manipulação do estéreo que um produtor deve dominar. Ela não é a solução para todos os problemas. E, inclusive, é possível realizar boas mixagens sem qualquer tipo de processamento mid-side.

É recomendável que o processamento mid-side seja realizado de forma sutil, sempre com pequenos ajustes para se alcançar um balanceamento ideal entre mid e side. Processamentos agressivos poderão acarretar em phase-shifting e problemas de mono-compatibilidade.

DICA NINJA: Embora existam vários tipos de processamento mid-side hoje em dia, o mais utilizado é a equalização. Alguns equalizadores que possuem função mid-side incluem o EQ8 do Ableton, o Equalizador do Logic-X, o FabFilter ProQ, o Ozone, dentre outros. O meu preferido é o FabFilter ProQ3.

PENSE NISSO: É importante lembrar que para realizar qualquer tipo de processamento mid-side em um sinal sonoro, o mesmo precisa conter informação estéreo. Caso contrário, o mid-side não cria estéreo. Com esse processamento, você basicamente balanceia um estéreo que já existia previamente.

UFA!

Acho que já deu pra termos uma boa noção sobre os fundamentos do processamento MID-SIDE. Agora, você precisa entender quando e porquê utiliza-lo, além de algumas técnicas que vão fazer a sua MIX ir para o próximo nível.

Por que utilizar processamentos MID-SIDE?

Basicamente, tanto na masterização, como na mixagem, o processamento mid-side se resume a equilibrar a quantidade de informação no mid e no side. Óbvio né? É… mas não é só isso!

Estéreo mais monocompatível

Vocês adoram o termo “monocompatibilidade”, né? Eu sei disso!

A monocompatibilidade é um pesadelo para muita gente. Se você não sabe que bicho é esse e o que ele come, vou explicar rapidamente.

Todo mundo gosta de um bom estéreo e todo produtor quer que a sua música tenha o máximo de abertura e profundidade. Entretanto, nem sempre a sua música será tocada em um sound-system estéreo. A esmagadora maioria dos sound-systems de clubes e festas é MONO. Além disso, muita gente hoje em dia escuta música em sound-systems bluetooth… MONO. E por fim, as plataformas de streaming também podem tocar o seu som em mono se a qualidade da internet não for muito boa.

Ou seja, sua música tem que ter um bom estéreo, mas ela PRECISA soar bem em mono!

E acontece que a maioria das técnicas de criação de estéreo não é monocompatível. Isso quer dizer que a sua música soará bem em estéreo mas não em mono. Lembra da FASE e da CORRELAÇÃO? Se o seu estéreo não tiver uma correlação positiva, quando os canais L e R forem somados, haverá cancelamento de fase. Para verificar isso em cada canal, você pode usar um plugin gratuito chamado Flux Stereo Tool V3.

Criar um estéreo monocompatível é o grande desafio (mas isso é tema para outro artigo).

O que você precisa saber agora é que o processamento MID-SIDE pode ajudar – e muito, o seu estéreo na questão da monocompatibilidade.

Controle independente do Mid e do Side

Utilizando plugins mid-side, você pode abrir ou fechar o estéreo, evidenciar ou atenuar o mid. Por exemplo, você tem um loop de bateria. Com um equalizador mid-side, no modo MID, você pode fazer um pequeno boost na nota fundamental do tom, ou do kick ou da caixa. Já utilizando o side, você pode evidenciar os agudos e criar uma abertura interessante.

É importante lembrar que esses processamentos, na maioria das vezes, precisam ser sutis, não ultrapassando 2-3dB.

Tornar os graves mais mono

Com um equalizador mid-side, você pode cortar o side somente dos graves, em um grupo, em canais individuais ou até mesmo no master-channel. É interessante manter em mono todas as informações abaixo de 100-150Hz.

Isso fará com que sua música fique com mais foco nos elementos principais!

Processamentos criativos

Com o controle individual de mid e side, você pode usar a sua criatividade para criar efeitos estéticos criativos em relação ao posicionamento dos elementos no campo estéreo.

O Mid-Side não é a solução para o seu estéreo!

Como já dito, o processamento mid-side não cria estéreo. Ele apenas serve para manipular um estéreo existente.

Agora que você já entendeu que o estéreo é a DIFERENÇA entre L e R, você já pode imaginar que, qualquer diferença que você provocar entre os 2 sinais será percebida como estéreo.

Portanto, para criar estéreo em um elemento, você pode criar uma equalização diferente em L e R (muitos equalizadores, além da função MID-SIDE, possuem a função L/R). O mesmo pode ser realizado duplicando o canal, paneando um para cada lado e aplicando qualquer tipo de manipulação do espectro, de forma diferente em cada um dos canais. Exemplo: em um canal você aplica uma saturação e no outro aplica uma saturação diferente. O mesmo com equalização, reverb, distorção, etc…

Sendo assim, o ideal é criar o estéreo em cada elemento da sua música, sempre checando a correlação de fase com algum plugin e somente depois de tudo pronto, aplicar os processamentos mid-side.

DICA NINJA: Existem alguns processos que criam estéreos aparentemente incríveis, mas que não são nada monocompatíveis. Um exemplo é o HAAS Effect. Mas ele não é o único. Reverbs muito abertos, alguns tipos de stereo-delays e MUITOS presets dos VSTs apresentam os mesmos problemas. Em um VST, toda vez que você abre muitas vozes no oscilador, isso pode gerar um timbre aparentemente interessante mas quase nunca é monocompatível. Sempre que for criar um timbre, observe como está a correlação de fase!

Técnicas de Equalização MID-SIDE

Existem inúmeras maneiras de utilizar os processamentos mid-side. Vamos conhecer algumas técnicas poderosas, sobretudo, em relação à equalização mid-side.

Tornar os low-end MONO

Não vou perder tempo aqui discutindo os porquês, mas o seu low-end (graves) vai ficar sempre melhor em mono. Sua música vai ter mais definição, pressão, kick e bass mais sólidos etc.

Uma maneira muito simples de fazer isso é com um equalizador mid-side. No caso, eu uso o FabFilter ProQ, mas o EQ8 do Ableton também possui essa função.

Na opção CHANNEL MODE, escolha “Mid/Side”. Crie um corte do tipo Hi-pass e não se esqueça de habilitar somente o side. Nesse caso, estamos retirando a informação do side de 100Hz pra baixo. Eu costumo fazer isso em grupos de elementos ou até mesmo no Master. Isso tornará o seu low-end mono, seguro e sólido!

Apliquei este EQ em um loop, no canal Master. Confira o resultado antes e depois.

Sem EQ -> Com EQ

Evidenciar o estéreo

Você também pode fazer um leve boost no side para evidenciar o estéreo. Mas, cuidado para não fazer boosts mto agressivos.

Confira o antes e o depois.

Sem EQ -> Com EQ

Evidenciar o MID nos médios e graves

O renomado engenheiro de mixagem Billy Bush (Garbage) disse:

Quando você puxa as informações do high-end nas laterais e mantém os médios e graves focados no centro, os detalhes do high-end (agudos) chamam a atenção dos ouvintes sutilmente para fora do campo estéreo, dando a impressão de que o som é mais largo. Ao manter os médios e low-end centralizados, você garante que a mixagem permaneça forte e monocompatível. Isso funciona particularmente bem com reverbs estéreo, delays, backing vocals e qualquer coisa que seja aberta no estéreo.

Billy Bush

Ele utiliza essa técnica em vocais mas o mesmo pode ser utilizado em qualquer elemento estéreo.

Em nosso exemplo, utilizando agora a curva em MID, eu fiz um leve boost na nota fundamental do kick, perto dos 50Hz, outro perto de 250Hz e decidi cortar um pouquinho em 500Hz para abrir mais espaço na mix.

Sem EQ -> Com EQ

Aplicar Mid-Side no send/return FX

Quando você utiliza, por exemplo, reverb, em um send/return channel, você pode inserir um equalizador mid-side em sequência, eliminando informações de graves e médios do MID. Desta forma o seu reverb terá menos chances de “lavar” a mix.

Técnica Ninja

Essa técnica vale a pena ser testada, principalmente em synth leads.

Envie o sinal de um canal para 2 canais auxiliares. Em um dos canais auxiliares, você irá deixar somente o MID e no outro somente o SIDE. Se você possui o plugin CENTER da Waves, é bem fácil. Adicione-o nos e canais e em um deles feche o center, no outro feche o side.

Se você não tiver esse plugin, dá pra fazer algo parecido com o Fab-Filter ProQ. Em um canal você fará um Hipass extremo no side e no outro fará o mesmo no mid.

No Ableton, existe uma forma bem fácil de fazer isso através de um rack. Aqui temos um video explicando rapidamente como se faz.

Pronto, agora você tem o MID e o SIDE em canais separados!

Agora, você pode ser criativo e aplicar diferentes efeitos em cada um dos canais.

No exemplo abaixo, temos um synth sem nenhum processamento.

Eu realizei o mesmo processo, enviando para 2 auxiliares e, no canal do SIDE, eu apliquei um REVERB.

E o mais interessante é que este é um procedimento mais “saudável” em relação à monocompatibilidade.

Você pode ser criativo e testar inúmeros efeitos diferentes em cada um dos canais, além de conseguir um excelente balanceamento entre mid e side.

Conclusão

Tentei reunir aqui o máximo de informações possíveis sobre o processamento mid-side. Embora o foco tenha sido nas técnicas de equalização, acredito que os conceitos tenham ficado relativamente claros na sua cabecinha! A partir de agora, é continuar estudando e testando para ver o que mais funciona na sua música.

Quero deixar bem claro aqui que o processamento mid-side é importante e pode gerar resultados sutis e interessantes na sua música. Mas, não é razão para entrar em paranóia! A sua vida não vai acabar se você não utilizar esse tipo de processamento em suas mixagens.

Como eu gosto de dizer, é necessário, antes de tudo, dominar bem o “arroz com feijão” da mixagem, para depois ficar se preocupando com essas técnicas mais avançadas.

Seu próximo passo

O PME-Club é a nossa formação completa para produtores de música eletrônica. Lá, você vai ter uma jornada de 10 fases, nas quais vai aprender todas as habilidades da produção profissional. Dentro da fase MIXAGEM, você vai ter um curso específico sobre Estéreo (A Arte do Estéreo) no qual você vai aprender tudo sobre MID-SIDE e outras técnicas para criação de Estéreo nas suas mixagens.


eduardojuliato

Eduardo Juliato se apaixonou pela música eletrônica em 2004, quando começou a frequentar as primeiras raves. Em 2005 começou a sua carreira como DJ e em 2009 como produtor. Em 2014 fundou a PME-Experts, uma escola online de produção de música eletrônica que hoje possui mais de 10 cursos e já ultrapassou os 2700 alunos. Seus conteúdos impactam semanalmente cerca de 30 mil pessoas nas redes sociais. Com seu projeto Sakyamuni, focado em Progressive Psytrance, tem lançado em importantes selos internacionais, como a Zenon Records, Soulectro e Weapon e tem se apresentado em todo o Brasil e em outros países como Peru, Bolívia e República Tcheca.

1 comentário

Frank Moris · 11/02/2020 às 12:22 am

ótimo conteúdo!

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